O Brasil é o quarto maior emissor de gás carbônico do mundo. Na Bahia, as conseqüências do excesso do gás na atmosfera já podem ser observadas em municípios como Euclides da Cunha e Uauá, onde há indícios de um processo de desertificação.

O estado tem 62% do seu território no semi-árido. Essa região, de acordo com dados do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), deve sofrer até 2050 um processo de desertificação e salinização. Esse processo pode atingir 50% das terras agrícolas da América Latina e do Caribe.

O coordenador do Programa Nacional de Ações de Combate à Desertificação e Mitigação dos Efeitos da Seca (PAN Brasil), José Roberto Lima, prevê que até meados do século o semi-árido baiano pode se expandir em até 20%. “Isso pode acontecer por causa de uma série de fatores naturais, como as mudanças climáticas provocadas pelo aquecimento global”, afirmou.

Algumas ações, como o seqüestro de gás carbônico e a utilização de energia renovável, estão sendo desenvolvidas no estado para minimizar os efeitos nocivos do gás na atmosfera. O governo da Bahia está se preparando para, em parceria com o Ministério do Meio Ambiente, fazer o levantamento das emissões e a partir daí elaborar um plano de ação capaz de reduzir o excesso do gás na atmosfera e suas conseqüências.

Antes mesmo de fazer o levantamento, o Estado lançou o programa Carbono Zero. Por meio dele, toda a emissão de gás carbônico provocada pelas viagens do governador nas aeronaves oficiais será compensada com o replantio de espécies de árvore nativa na Serra do Conduru, em Ilhéus. “O CO² não é poluente. O excesso dele é que deixa mais densa a camada atmosférica, causando o aquecimento”, disse o doutor em Política Energética e pesquisador da Unifacs, Soliano Pereira.

A coordenadora do Fórum de Mudanças Climáticas da Bahia, Adriana Diniz, afirmou que a intenção é formular outras ferramentas para reduzir os efeitos do gás. Segundo ela, o levantamento vai ajudar na formulação dessas estratégias.

Para discutir esse assunto, a Secretaria de Meio Ambiente e Recursos Hídricos (Semarh) agendou para setembro a Conferência Estadual de Meio Ambiente, cujo tema será Aquecimento Global –Território e Sociedade.

Quando as emissões forem calculadas, os estudiosos vão poder fazer o zoneamento ecológico, saber quantas árvores precisam ser replantadas para neutralizar a emissão de carbono e fazer o planejamento estratégico das lavouras.

De acordo com as alterações do clima decorrente do efeito estufa, eles vão saber se determinada cultura tem como se adaptar ao local ou deve migrar para áreas com clima mais ameno.

Soliano explicou que as queimadas são a principal fonte emissora de gás carbônico no Brasil. Na Bahia, a causa ainda não é conhecida, mas o pesquisador acredita que a agropecuária pode ser a maior delas.

As causas são diversas, mas os efeitos são mensurados por grandes áreas. “A ciência não aceita que impactos locais sejam atribuídos como efeitos. Os modelos são globais e simulam grandes regiões”, disse o professor.

Com isso, os efeitos que afetarão a Bahia devem ser os mesmos previstos para a América Latina: alterações nos recursos hídricos e ecossistemas, dificuldades na geração de alimentos, mudanças nos sistemas costeiros e impactos na indústria, sociedade e saúde, porque o aumento das temperaturas pode provocar a expansão das doenças infecciosas, a exemplo de malária, dengue, meningite e leishmaniose.

Se a emissão do gás carbônico continuar nos mesmos níveis de hoje e não forem adotadas medidas compensatórias, até 2050 haverá a substituição gradual das florestas por cerrado, a caatinga sofrerá um processo de desertificação, regiões mais baixas vão sofrer inundação e haverá uma queda na produção agropecuária. A temperatura da Terra vai se elevar em 1,6°C.

Soliano destacou que culturas como o algodão e o café tendem a desaparecer da Bahia e serem replantadas em regiões de clima mais temperado. “Devemos nos preparar para essas mudanças. Na agropecuária, uma solução é o desenvolvimento de espécies mais resistentes”, disse.

De acordo com o coordenador da Área de Clima do Greenpeace, Luís Henrique Piva, é preciso conhecer a vulnerabilidade de cada região para poder combater os efeitos.

O superintendente de Políticas para o Desenvolvimento Sustentável da Semarh, Eduardo Mattedi, disse que o planeta corre o risco de até 2100 perder 30% da sua biodiversidade. “Se controlarmos esse processo vamos poder oferecer mais resistência e capacidade de adaptação às espécies”, observou.

Mattedi afirmou que as políticas públicas devem ser pensadas a longo prazo, e não por gestão. “O plano que vamos elaborar leva em conta impactos que acontecerão daqui a 30 anos. Um governo não deve limitar sua ação aos quatro anos de gestão”, declarou.

Energia alternativa é solução viável

O uso de energia renovável é uma das saídas para a redução da emissão de CO². Na Bahia, 15 mil casas já utilizam a energia solar. O uso se estende também para outros fins. A Companhia de Engenharia Rural da Bahia (Cerb) utiliza no semi-árido equipamentos abastecidos pelo sol.

Nas regiões mais secas e distantes do estado onde ainda não havia luz elétrica, a Cerb instalou dessalinizadores, que retiram o sal da água captada em poços tubulares por meio de osmose reversa, que torna a água salobra em potável.

A energia solar para o bombeamento de água em poços tubulares vem sendo utilizada pela companhia desde 1996, mediante placas fotovoltaicas que convertem a luz do sol em energia elétrica. Todo o sistema é ligado e desligado automaticamente, sem a presença de operador.

Outra forma de energia usada pela Cerb é a eólica, onde são utilizados cata-ventos e aerogeradores. Essa fonte alternativa foi implantada pela empresa, em ação pioneira na Bahia, na localidade de Romão, município de São Gabriel, a 500 quilômetros de Salvador, na região de Irecê, onde foi instalada a primeira unidade do aerogerador, que utiliza a energia do vento para o bombeamento da água.

Instalados em torres de 10 a 20 metros, os aerogeradores são capazes de produzir de 1 mil a 1.500 watts de energia, o suficiente para acionar equipamentos de bombeamento. Ao todo, já foram instalados 24 cata-ventos, que funcionam com baixa velocidade. Bombas manuais, adaptadas no próprio corpo do equipamento, possibilitam o bombeamento mesmo quando não há vento.

A geração de energia eólica para casas é uma novidade no estado. A primeira comunidade a ser beneficiada com esse tipo de ação é a de Barra Velha, no município de Nova Viçosa, a 955 quilômetros de Salvador. Até o final deste mês, 350 pessoas vão ser beneficiadas. Em Barra Velha está sendo instalada energia eólica e solar. Além das casas, o projeto beneficia uma central de armazenamento de peixes.

A energia está chegando à Ilha por meio de um projeto da Secretaria de Meio Ambiente e Recursos Hídricos, em parceria com a Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado da Bahia (Fapesb) e Universidade Salvador (Unifacs).

A coordenação do projeto ficou por conta de Soliano. A comunidade necessitava de energia para poder resfriar os peixes. “Levar energia elétrica para lá era muito caro, porque havia a necessidade de cabos submarinos. Com o uso de energia renovável, além de evitar a emissão de gases, resolvemos o problema da comunidade”, disse o professor.

Soluções para o Brasil

Em 100 anos, a temperatura da Terra aumentou em 0,7ºC. Esse aquecimento provoca o derretimento das grandes massas de gelo, que aumentam o nível médio do mar, ameaçando as ilhas oceânicas e as zonas costeiras.

O excesso de calor também torna furacões, tufões e ciclones mais intensos e destrutivos. Temperaturas mínimas ficam mais altas, enxurradas e secas mais fortes e regiões com escassez de água, como o semi-árido, viram desertos.

No Brasil, a medida mais urgente para frear esse processo é parar o desmatamento e as queimadas na Amazônia. As grandes hidrelétricas, que inundam imensas áreas de floresta, são também grandes emissoras de CO².

As usinas a carvão mineral causam grande impacto ecológico e são uma grande fonte de gás carbônico. A energia nuclear, segundo o coordenador da Área de Clima do Greenpeace, não deve ser adotada, “pois ela é suja, cara, insegura e ultrapassada”, disse.

Para Piva, ao investir em eficiência energética, o Brasil poderá economizar 25% da energia que consome. “Somente nas linhas de transmissão o país perde 18% da energia que gera”, observou.

Ele afirmou que o Brasil tem um imenso potencial eólico e solar que precisa ser explorado. Pequenas centrais hidrelétricas sem barragem e o biogás gerado nos aterros sanitários e nas estações de tratamento de esgotos são também alternativas importantes para a geração de energia no país.

Seminário

De domingo a terça-feira acontece em Salvador o Seminário Internacional de Combate à Desertificação e Mitigação dos Efeitos da Seca. Promovido pela Superintendência de Recursos Hídricos (SRH), o evento vai contar com a presença de Leonardo Boff, estudioso em Ecologia.

Boff é autor de mais de 60 livros de ecologia e preservação. A abertura acontece domingo, às 20h, no Hotel Pestana, Rio Vermelho. Na segunda e na terça-feira, o evento será realizado no auditório da Fundação Luís Eduardo Magalhães (Flem), no Centro Administrativo.