"Kizoonga" e "Apemukatê". As palavras de origem africana e indígena, respectivamente, significam “reunião”. Reunir os dois povos para tornar visível o que antes era ignorado pelo estado foi objetivo do primeiro seminário de capacitação para a aplicação do Cadastro Único do Bolsa Família (CadÚnico), realizado hoje (20), no auditório da Seinfra, com representantes dos 185 município baianos que têm comunidades quilombolas e povos indígenas em seus territórios. O evento é uma iniciativa da Secretaria de Desenvolvimento Social e Combate à Pobreza, em parceria com a Secretaria de Promoção da Igualdade e a Fundação Palmares.
O objetivo da Sedes é inserir, de forma diferenciada, as comunidades indígenas e quilombolas no CadÚnico, aprimorando a base de dados para um melhor diagnóstico, e promover a cobertura do serviço de transferência de renda para esses povos. “Só vamos conseguir isso se os gestores municipais forem nossos parceiros. Temos que fazer valer os direitos negados a esses segmentos”, disse o secretário Valmir Assunção.
Ele ressaltou que a ampliação do cadastro será acompanhada de políticas públicas para a emancipação dos que já dependem do Bolsa Família. O programa é responsável pelo repasse mensal de R$ 112 milhões pelo governo federal aos municípios da Bahia, onde mais de 1,4 mil famílias precisam de transferência de renda para sobreviver.
Grande parte de quilombolas e indígenas não possue documentação civil. “Vamos fazer com que esse direito à cidadania seja efetivado. Os documentos serão instrumentos para eles conseguirem regularizar suas terras e se inserirem em novos programas e políticas públicas”, garantiu o secretário.
O coordenador do Bolsa Família no estado, Adelmo Severino, informou que há famílias indígenas e remanescentes de quilombos beneficiárias do programa, mas não estão identificadas como comunidade tradicional.
A diretora do CadÚnico no Ministério de Desenvolvimento Social e Combate à Fome (MDS), Ana Vieira, disse que a base de dados fornecida pelo cadastro atual ainda não é adequada, mas que aponta um grave quadro de vulnerabilidade social e insegurança alimentar entre quilombolas e indígenas. “Precisamos conhecer e detalhar os aspectos mais relevantes para a formulação de políticas específicas”, afirmou.

Dificuldades

De acordo com pesquisa técnica da Sedes, os fatores que mais dificultam uma formatação mais adequada do cadastro são a falta de documentação civil, questões fundiárias mal resolvidas, especificidades sócio-culturais e o isolamento territorial das comunidades. “Muitos não são contemplados pelo programa porque nem sabem que têm direito”, informou a chefe de gabinete da Fundação Palmares, Jucelina Nascimento. Ela afirmou que a ação integrada proposta pela Sedes significa “tirar esses povos da invisibilidade histórica e colocá-los sob a égide e responsabilidade do Estado”.
A chefe de gabinete da Sepromi, Sandra Silveira, disse que o tratamento diferenciado dos povos tradicionais pelas políticas públicas deve ser urgente. “Não podemos esquecer o passado. Essa é uma responsabilidade das três instâncias de governo. As demandas dessas comunidades são seculares e precisam ser acatadas na íntegra”, defendeu.
“Não dá para incluir a gente no modelo que já existe”, disse o coordenador de comunidades indígenas da Sedes, Agnaldo Pataxó. Edmar de Souza, da tribo Pataxó Hãhãhãe, de Pau Brasil, ratifica: “O novo CadÚnico é uma forma de o governo tratar a realidade dos povos indígenas, que é diferente. Temos dificuldade de conseguir trabalho, de nos locomover, de ter educação e saúde”, acentuou.