A Bahia foi campeã nacional em denúncias de abuso e violência sexual contra crianças e adolescentes no ano passado. Os números foram apresentados durante a entrega de um Diagnóstico do Atendimento Policial a Crianças e Adolescentes em Situação de Violência Sexual no Estado da Bahia, elaborado pelo Comitê de Enfrentamento à Violência Sexual Contra Crianças e Adolescentes (Cedeca), composto por 74 organizações governamentais e não-governamentais.  Juntamente com o diagnóstico, o comitê entregou ao governador em exercício, Edmundo Pereira, uma pauta de solicitações para combater o problema.

Segundo a procuradora de justiça do Ministério Público e coordenadora do Centro de Apoio das Promotorias da Infância e da Juventude, Lícia Oliveira, em 2005 foram 225 casos no estado, em 2006 foram registradas 467 ocorrências e até maio deste ano já são 279 denúncias. “Isso se deve ao trabalho desenvolvido pelo comitê e pelas campanhas de sensibilização da sociedade”, afirmou. Ela disse que o órgão tem como meta institucional do seu planejamento estratégico a criação de Conselhos Tutelares em todo o estado da Bahia. Segundo Oliveira, há três anos existiam na Bahia apenas 71 conselhos para 417 municípios. Hoje, já são 283 unidades instaladas.

Para o coordenador do Comitê Estadual, Waldemar Oliveira, o diagnóstico aponta uma carência de delegacias especializadas e de atendimento adequado às vítimas. Segundo ele, na maioria delas, os peritos são homens, o que causa constrangimento às vítimas. “É um trauma inesquecível, nós atendemos crianças que chegam completamente desestruturadas devido à violência que sofreram. Temos também contato com mulheres adultas que foram agredidas e carregam o trauma para o resto da sua vida”, descreveu. Conforme o Cedeca, as maiores vítimas são jovens do sexo feminino entre 14 e 17 anos. 

Punição

Waldemar disse ainda que, entre as solicitações, o ponto mais urgente é a punição rigorosa dos criminosos. “Poucos exploradores são punidos por seus crimes e isso é um estimulante para o aumento dos casos”, reforçou. Ele disse que também faz parte da proposta a criação de uma força-tarefa constituída de policiais civis, militares e do Ministério Público voltados exclusivamente para o combate à exploração sexual.

“Com certeza, a organização policial já pode responder ao pleito e intensificar a repressão a essa prática. Isso é sem dúvida nenhuma necessário, mas só é possível com as denúncias e o seu encaminhamento envolve a quebra do pacto de silêncio”, disse a secretária de Justiça, Cidadania e Direitos Humanos, Marília Muricy. Ela lembrou que há a necessidade de que a mídia se torne uma aliada à campanha, disseminando mensagens que comprometam o cidadão com a denúncia e o afastem do silêncio cúmplice. “Em síntese, eu estou falando em um plano de educação em direitos humanos que a SJDH já está começando a elaborar”, afirmou.

O governador em exercício, Edmundo Pereira, garantiu que o Governo do Estado vai ser atuante no seu compromisso de combater a exploração e a violência sexual contra crianças e adolescentes. “Vamos colher muitos frutos bons dessa reunião, pois tomamos parte da situação grave em que a Bahia se encontra e é preciso que o governo e a sociedade organizada façam um verdadeiro mutirão para acabar com esse silêncio”, concluiu.

Denúncias

A denúncia nacional pode ser feita no Disque 100. Em Salvador, há a Delegacia Especializada para a Repressão de Crimes contra a Criança e o Adolescente (Derca), o Ministério Público, o Cedeca. O telefone é o 0800-284-5551. O denunciante não precisa se identificar e nós vamos apurar os casos.

O Dia Nacional de Combate ao Abuso e à Exploração Sexual Infanto-Juvenil tem o intuito de reafirmar a importância de se denunciar e responsabilizar os autores de violência sexual contra a população infanto-juvenil.

O 18 de maio foi instituído em 2000, em alusão a um crime ocorrido no Espírito Santo, há 27 anos, em que Araceli Cabrera Sanches, então com oito anos, foi violentada e assassinada. A campanha do Dia 18 de maio, produzida pelo Centro de Defesa da Criança e do Adolescente Yves de Roussan (Cedeca/BA), foi adotada pelo Governo Federal.

Um levantamento da Universidade de Brasília (UNB), feito em parceria com a Secretaria Especial de Direitos Humanos (SEDH) e o Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF), registra casos de exploração sexual comercial de crianças e adolescentes em 927 dos 5.561 municípios brasileiros. Mas o tabu que ainda envolve esse tipo de crime faz crer que muitos casos sequer chegam a ser denunciados.