A passagem da data alusiva ao golpe militar de 64, 31 de março, exige sempre uma reflexão em torno do regime ditatorial no Brasil. A Diretoria de Artes Visuais e Multimeios (Dimas) da Fundação Cultural do Estado elegeu uma programação que visa promover uma crítica desse passado não tão distante. O documentário Dom Hélder Câmara, o Santo Rebelde, de autoria da mineira Erika Bauer, é a novidade na grade da Sala Walter da Silveira, de amanhã (30) até 5 de abril, quando também estarão em exibição, em reprise, os filmes Madame Bovary, de Claude Chabrol, Eu Me Lembro, de Edgar Navarro, e Brilhante, de Conceição Senna.

O filme de Érika Bauer enfoca a trajetória do arcebispo emérito de Olinda e Recife, falecido em 1999, e cobre desde sua participação como figura central da ala progressista da Igreja Católica, na década de 1950, criando a Conferência Nacional de Bispos do Brasil (CNBB) e o Conselho Episcopal Latino-Americano (Celam), até suas ações durante a ditadura militar.

Militante tenaz contra o regime autoritário e a favor da chamada Teologia da Libertação, Dom Hélder foi símbolo de uma nova igreja: ‘a Igreja dos Pobres’. Recém-empossado em importante cargo na hierarquia eclesiástica, em 17 de abril de 1964, dias depois do golpe militar, ele divulgou um manifesto apoiando a ação católica operária em Recife.

Proibido de falar no Brasil, ele passa a aceitar convites para conferências e pregações no exterior. No período mais repressivo da ditadura militar, entre o final dos anos 60 e início dos 70, o assessor de Dom Hélder, padre Antônio Henrique, é preso, torturado e morto. Outros 20 colaboradores de sua arquidiocese são presos e torturados. Em Paris, em maio de 1970, Dom Hélder faz um contundente pronunciamento, em que denuncia, pela primeira vez no exterior, a prática de tortura a presos políticos no Brasil.

A coragem do arcebispo o transformou em personagem do mundo, um símbolo de resistência à ditadura. Em 1972, seu nome é indicado para o Prêmio Nobel da Paz. Em meados dos anos 80, ao se aposentar, deixa mais de 500 comunidades de base organizadas, que reúnem operários, trabalhadores rurais, retirantes e pescadores, em luta por melhores condições de vida.

Depois, Dom Hélder participa da campanha pelas ‘Diretas Já’ e, a seguir, durante a Assembléia Nacional Constituinte, percorre o país realizando debates e palestras de conscientização para a cidadania. Aos 80 anos de idade, sempre atuante, Dom Hélder, alcunhado de ‘Peregrino da Paz’, lança-se à articulação de uma campanha pela erradicação da miséria no país. A primeira e principal proposta é lutar por uma reforma agrária, para colocar o Brasil no caminho da justiça social.

O  arcebispo emérito de Olinda e Recife falece em 1999. No documentário, sua luta é contada por amigos, estudiosos e por ele próprio, em cenas e fotos inéditas.