O Balé Teatro Castro Alves (BTCA) vai contar este ano com um aporte de recursos maior do que em 2007. Serão alocados mais de R$ 500 mil para montagem do novo repertório – a companhia vai estrear quatro espetáculos inéditos em 2008 – e para circulação desses espetáculos pelo interior. Com a ampliação de sua atuação, o investimento na produção artística do balé, a primeira companhia oficial de dança do Norte/Nordeste, criada em 1981, está sendo triplicado em relação ao ano passado. No total, incluindo a folha de pagamento, serão gastos mais de R$ 2,5 milhões com o BTCA.

Responsável por dois terços dos custos relativos à dança na Bahia, o BTCA agora estreita o diálogo com as companhias independentes de dança, articula suas atividades junto a instituições de ensino na área, estende suas apresentações ao interior, revalida seu repertório anterior através do projeto BTCA Memória Dança e avança no debate sobre o papel das companhias oficiais de dança.

Segundo a diretora de Dança da Fundação Cultural do Estado da Bahia (Funceb), Lúcia Matos, responsável pela formulação de políticas públicas para o desenvolvimento dessa área no estado, a reestruturação do Balé Teatro Castro Alves tem como principal objetivo ampliar suas funções e o retorno do investimento público realizado pelo Estado na companhia.

“Quando criado, o balé tinha como principal objetivo representar a excelência artística da dança da Bahia fora do estado e no exterior, papel que sempre cumpriu. Mas o BTCA representa parte da produção em dança da Bahia, e hoje entendemos que uma companhia mantida com recursos públicos deve ser também um instrumento de política pública, estimulando a formação, a criação e o fortalecimento de outras companhias de dança, com um repertório de espetáculos que possam circular tanto nacional e internacionalmente, quanto dentro do estado”, explicou Lúcia.

Com o projeto Interação Dança – BTCA Residência, que vai oferecer a um determinado grupo ou companhia a residência de três meses no Teatro Castro Alves, o balé poderá fortalecer a cena de dança no estado, tornando-se mais íntimo das manifestações artísticas circundantes.

Já a aproximação entre o BTCA e a Escola de Dança da Funceb visa transformar essa instituição de ensino num centro de excelência para formação de bailarinos de dança contemporânea. “Com o BTCA Extensão, bailarinos veteranos da companhia terão opção de contribuir para elevar a qualidade técnica da formação desses profissionais, que terão mais chances de integrar uma companhia com a excelência do Balé Teatro Castro Alves. Hoje, a maior parte dos bailarinos contratados via Regime Especial de Direito Administrativo (Reda) são de fora do estado”, afirmou Lúcia Matos, que insere as mudanças do balé num contexto mais amplo da nova gestão da dança na Bahia.

“No ano passado, dobramos o número de alunos e de professores da Escola de Dança da Funceb, que também vem desenvolvendo atividades de extensão em centros culturais de bairros periféricos de Salvador. Além disso, lançamos vários editais para apoio de companhias independentes. Tudo isso visa a excelência artística de nossos bailarinos e de nossas companhias de dança, com o estímulo também à formação de público”, declarou a diretora.

Ela ressaltou o esforço realizado pela atual gestão da cultura na Bahia para promover o desenvolvimento da dança por meio do incentivo ao fortalecimento de toda sua cadeia produtiva, o que envolve produção, pesquisa, formação, registro, memória e circulação de espetáculos.

Novos rumos das companhias oficiais

A discussão sobre os novos rumos das companhias oficiais de dança ganhou força junto à opinião pública nas últimas semanas. A necessidade de aliar políticas públicas às novas diretrizes do BTCA encampada pela Secretaria Estadual de Cultura (Secult) mobilizou diversos setores da imprensa e do meio cultural para o debate.

A junção dos corpos de baile do BTCA I e do BTCA II pôs fim à antiga distinção entre uma companhia com reconhecimento internacional, formada, em parte, por bailarinos concursados e por bailarinos mais jovens incorporados ao grupo via contratos temporários (Reda), e uma segunda companhia, criada em 2004 para trazer de volta à ativa bailarinos efetivos com idade acima de 35 anos que tinham sido afastados do palco em plena idade produtiva e continuavam recebendo seus salários sem nenhuma prestação de serviço ao Estado.

A mudança trouxe à tona questões como a presença majoritária de veteranos implica numa queda da qualidade do grupo? “O entendimento da nova direção do BTCA é de que a formação de um elenco heterogêneo, ainda que formado, em sua maioria, por bailarinos com mais de 35 anos, em nada compromete a excelência dos espetáculos”, disse o novo diretor artístico do balé, Paullo Fonseca.

Para ele, a aposta no corpo estável do BTCA valoriza o papel do bailarino como intérprete e co-autor da coreografia. “Mas não estão descartadas futuras contratações. Isso dependerá dos projetos que vamos desenvolver a partir de 2009. A opção, este ano, por não renovar os contratos temporários visa reconhecer a identidade desse corpo estável que volta a trabalhar em conjunto e apostar num repertório mais enxuto e com mais mobilidade para viajar, o que não implica abandonar o repertório anterior e nem quer dizer que o Balé Teatro Castro Alves vai trabalhar a partir de agora apenas com esses bailarinos e com esse conceito”, afirmou.

Especialistas opinam sobre mudanças no BTCA

Lia Robatto (coreógrafa, professora e pesquisadora de dança, membro do Conselho Estadual de Cultura):
“O corpo do bailarino é a linguagem do coreógrafo. Ele não pode ser limitado a nenhuma faixa etária. Quanto maior for o leque desses corpos, quanto maior a diversidade, maior será a qualidade.”

“Tanto o grupo convidado quanto o corpo estável se beneficiam com o projeto BTCA Residência. O primeiro, ao travar contato com uma companhia profissional, trabalhará em condições mais favoráveis e num regime de maior disciplina. Já o segundo recebe uma injeção de novas propostas e corpos a serem intercambiados, o que compensa a não contratação de novos bailarinos no momento.”

“O que é importante na nova proposta para o BTCA são as várias linhas de ação, o que não reproduz a mesmice de um corpo estável mais convencional – o lado da memória, a investigação criativa, a mistura de linguagens, a participação de convidados de fora, tudo isso enriquece o projeto.”

Carla Leite (professora da Escola de Dança da Ufba): “Todas essas questões sobre a idade dependem muito da proposta. O pessoal de Pina Bausch e muitas outras companhias importantes investem em dançarinos mais maduros. É um equívoco pensar que o dançarino quando chega aos 30, 40 anos não pode mais dançar.”

Dulce Aquino (diretora da Escola de Dança da Ufba): “A junção do BTCA com a Escola de Dança da Funceb é muito salutar, pois se trata de um resgate da tradição. É um costume antigo dos teatros e dos corpos de baile terem a sua própria escola de dança, e esta nova parceria se aproxima desse modelo, aumentando as possibilidades da Bahia formar bailarinos de alta excelência.”

“Já tivemos muitos grupos profissionais, mas, infelizmente, quando foi criado o BTCA, a verba da dança se concentrou muito nele. Agora, com a publicação de editais, voltamos a ter a possibilidade de reativar esses grupos, que estão tendo a chance de uma atuação mais continuada.”

“Novas possibilidades para as companhias oficiais de dança têm sido discutidas no mundo inteiro. Ter um balé como forma de representação de uma cidade ou estado é um modelo arcaico e que deve ser revisto. Somos uma cultura muito plural. Então, não é possível que um corpo estável represente todo o estado.”