A educadora Fátima Freire Dowbor, filha de Paulo Freire, criador da "pedagogia da autonomia" e dos "círculos de cultura", ministra na próxima segunda-feira (30), em Salvador, a palestra "Quem educa marca o corpo do outro". A aula, que será realizada às 16h, marca o início do curso "Capoeira – Educação para a Paz", iniciativa da Secretaria da Cultura do Estado, e que será realizado ao longo de 2008, no Forte de Santo Antônio Além do Carmo, no Centro Histórico.

O evento de abertura do curso tem início às 14h30 com a composição de uma roda de conversa. Em seguida, será a vez do artista senegalês Doudou Coumbua Rose, pedir a benção aos Mestres que ocupam o Forte de Antônio Além do Carmo, reduto histórico da luta e resistência de diversos grupos de capoeira em Salvador.

O curso "Capoeira – Educação para a Paz" vai contribuir para a inclusão da capoeira no currículo educacional, aproximando o caráter dialógico e inclusivo da capoeira a vivências pedagógicas colaborativas. O objetivo é oferecer ferramentas para os capoeiristas-educadores relacionarem os valores deste jogo na construção da afetividade e educação para a paz. O processo educativo também deve reconhecer a importância dos saberes ancestrais, simultâneo aos conhecimentos escolares.

As inscrições para o curso já estão abertas. Serão capacitados, neste primeiro momento, 80 capoeiristas, orientados por especialistas, em duas turmas de 40 alunos, cada uma com a carga horária de 160h. Para participar do curso, eles precisam ser indicados por outros mestres, de diferentes bairros e escolas de capoeira da cidade de Salvador e região metropolitana. Os capoeiristas-educadores serão multiplicadores já que, em princípio, atingem diretamente mais de 1.600 pessoas através de suas atividades com alunos em outros bairros e escolas da rede de ensino da cidade de Salvador.

A aula inaugural vai mostrar que o processo de "humanização" é marcado pelas relações de aprendizagem que vivenciamos ao longo da nossa história de vida. "Nossa forma de aprender está marcada pela maneira como fomos iniciados nos nossos primeiros contatos com o mundo das coisas e com o mundo das pessoas. Como fomos ensinados a olhar, a falar, a tocar e a perceber as cores e odores do mundo que nos cerca", explica Fátima Freire, que escreveu um livro sobre o tema.

O projeto "Capoeira – Educação para a Paz" contém essas premissas básicas, relacionando a capoeira com vivências pedagógicas colaborativas que asseguram, positivamente, as relações étnico-raciais, contribuindo para o sentido de ser, pertencer e participar solidariamente do lugar onde se vive.

"O curso trata de um processo de acolhimento, incluindo diferenças de idade, gênero e possíveis portadores de deficiências e necessidades especiais, considerando a saúde como um bem a ser cultivado individual e coletivamente", defende a historiadora Vanda Machado, idealizadora do curso e coordenadora do projeto Irê Ayó, que visa abrir espaço nas escolas para inclusão da cultura afro-brasileira nas escolas.

O curso

Iniciativa da Secretária de Cultura, o curso "Capoeira – Educação para a Paz" tem a finalidade de participar da aplicação da Lei Federal Nº. 11.645/2008. A lei estabelece as diretrizes e bases da educação nacional incluindo no currículo oficial da Rede de ensino a obrigatoriedade da temática "História e Cultura Afro-Brasileira e Indígena". A Educação das Relações Étnico-Raciais é um desafio a ser enfrentado pela sociedade e todos os órgãos do governo federal, dos estados e dos municípios, tanto na concepção, quanto na operacionalização das políticas públicas voltadas para a valorização da ancestralidade.

As aulas serão realizadas de segunda à sexta-feira, das 14h às 18h, no Forte de Santo Antônio Além do Carmo. Um dos módulos do curso será dado por Maurício José Teixeira, o Mestre Louro, que vai tratar de capoeira e inclusão. "Vou levar o educador-capoeirista a refletir sobre a inclusão das pessoas portadoras de necessidades especiais, para que todos sejam acolhidos no jogo", diz o mestre. Maurício é professor de capoeira da APAE – Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais e implantou a capoeira no currículo da instituição. "Tenho cerca de 200 alunos com Síndrome de Down que jogam capoeira respeitando sua formação física e corporal", afirma o Mestre.

"Além de formar capoeiristas-educadores, o curso pretende também, motivar políticas públicas voltadas para a valorização da ancestralidade, propiciando o reconhecimento e a valorização do patrimônio material e imaterial incluindo manifestações, feiras, festas, celebrações, lugares, saberes e fazeres, que funcionam como princípios para a construção da identidade, auto-estima e convivência solidária", explica o Secretário de Cultura, Márcio Meirelles. "Esta é uma política de fundamental relevância no sentido de se re-configurar outras formas de educação e de relações entre negros e não negros, compreendendo que, historicamente, os dispositivos jurídicos para o povo negro impediram a cidadania plena e o acesso aos bens sociais em nosso país", complementa o Secretário.

De acordo com o Iphan – Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional / Ministério da Cultura, a capoeira é considerada patrimônio imaterial do Brasil, e tem a Bahia como lugar de origem e simbólico dessa manifestação cultural. Além disso, a capoeira é tombada como patrimônio baiano pelo Estado através do Ipac – Instituto do Patrimônio Artístico e Cultural.

Palestrante

Fátima Freire Dowbor trabalhou como educadora em diversos países e, ainda adolescente, acompanhou seus pais, Elza e Paulo Freire, no exílio. Formada em Pedagogia pela PUC de São Paulo, Filosofia pela Universidade de Coimbra (Portugal), Psicopedagogia pelo Instituto Jean Jacques Rousseau (Suíça), Línguas Romanas pela Universidade de Varsóvia (Polônia) e Mestrado em Semiótica (PUC/SP), Fátima foi coordenadora pedagógica de inúmeros colégios em São Paulo. A educadora é membro do Instituto Paulo Freire, trabalha em consultoria pedagógica em várias instituições e realiza palestras em congressos e encontros nacionais e internacionais.