No último dia de inscrição para o Edital de Pontos de Cultura, dezenas de pessoas compareceram à Secretaria de Cultura do Estado para cumprir o prazo determinado pelo concurso. “Recebemos aqui inscrições de municípios como Caldas do Jorro, Santo Amaro, Maragogipe, Cachoeira, Itaberaba, Salinas das Margaridas, sem contar os que chegaram depois pelos Correios”, comemora a Superintendente de Cultura, Ângela Andrade. No total, foram mais de 350 inscritos para pleitear os recursos de R$60 mil por ano, durante três anos, para o desenvolvimento de atividades culturais em suas comunidades.

O resultado deve ser divulgado até meados de setembro. O acompanhamento do projeto em cada fase da seleção, que envolve desde a análise de documentos e formulários até análise técnica e de mérito, pode ser feita através do site www.cultura.ba.gov.br/pontosdecultura .

Através de uma parceria entre os governos estadual e federal, será destinado, no total, um montante de R$27 milhões para apoiar organizações socioculturais que desenvolvam projetos de ação continuada, a exemplo de oficinas de formação, atividades de intercâmbio, circulação e memória.

“O objetivo é apoiar ações estruturantes para o desenvolvimento cultural do estado, promovendo a inclusão social e digital através da cultura”, observa Neuza Britto, diretora de Integração Regional da Secult.

Esse é o caso da Associação Beje Eró (Cosme e Damião, em iorubá), que há sete anos atende a cerca de 150 adolescentes do Engenho Velho de Brotas, oferecendo oficinas de teatro, dança, percussão e cidadania. Aguardando a vez para efetivar sua inscrição, no último dia 30 de junho, o arte-educador Anativo Oliveira contou que, caso a Beje Eró seja um dos Pontos de Cultura selecionados pelo edital, a associação vai fortalecer sua atuação.

“Nós nunca tivemos realidade orçamentária e agora temos a chance de contar com recursos para nossas atividades”, explica, animado com a possibilidade de adquirir computadores e equipamentos multimídia como câmeras de vídeo, ilha de edição e estúdio de gravação de som. “São instrumentos hoje indispensáveis para o trabalho com adolescentes”, pontua.

No primeiro ano, todos os Pontos de Cultura selecionados deverão investir R$25 mil na aquisição de um kit multimídia com esses equipamentos. De acordo com a coordenadora do projeto, Sophia Rocha, o investimento é fundamental para a inclusão digital dos grupos, divulgação de suas produções culturais e o intercâmbio com uma rede formada por mais 685 pontos de cultura em todo o país. “Os projetos devem ter como meta a geração de renda e a sustentabilidade”, explica.

Sustentabilidade e desenvolvimento social

Ao apoiar associações comunitárias que atuam, em geral, com poucos recursos, sem infra-estrutura e, quase sempre, de forma voluntária, o projeto Pontos de Cultura, uma das ações prioritárias do programa federal Mais Cultura, tem como objetivo garantir a continuidade e a sustentabilidade de iniciativas consideradas importantes para o desenvolvimento social do país através da cultura. Os exemplos de organizações com esse perfil na Bahia não são poucos.

Membro da Cia. Cultural São Vicentina de Quadrilha Junina, Edilson Santos Silva, engenheiro e consultor ambiental que vive na Vila S. Vicente, distrito com apenas quatro mil habitantes, a 42 km de distância de Itaberaba, soube do edital numa visita ao município, através de um anúncio no carro de som, a três dias do encerramento das inscrições. Acostumado a elaborar projetos ambientais, não teve dúvidas e correu para a sede da Secretaria de Cultura em Salvador.

Marcador e coreógrafo da Cia de Quadrilha Junina há 15 anos, ele conta que, se o projeto for selecionado como Ponto de Cultura, vai utilizar os recursos para adquirir instrumentos como a sanfona de 8 cordas, a famosa “pé de bode”, pandeiro e triângulo; contratar músicos, coreógrafo, professor de dança e costureira; comprar tecidos para a confecção das indumentárias; e contratar serviço de transporte para apresentação das quadrilhas em outros municípios e regiões. "Hoje tudo é feito de forma improvisada e voluntária. Fazemos bingo, pedimos apoio de comerciantes de Itaberaba. Mas, mesmo assim, já fomos classificados três vezes no concurso Arraiá do Galinho”, orgulha-se.

Formada por três quadrilhas – uma infantil, uma de adolescentes e adultos, e outra de idosos – a Cia hoje é coordenada pelo Departamento de Cultura da Associação Comunitária Vila. S. Vicente e dos Produtores Orgânicos do Vale do Paraguaçu e Regiões. Para participar da quadrilha, as crianças da comunidade precisam ter média sete na escola. Já os idosos precisam ser alfabetizados ou estarem inscritos em programas de alfabetização.

Para Edilson, a Cia de Quadrilhas tem um impacto positivo na educação dos habitantes da vila. “Temos índices baixíssimos de violência e mais de 50 jovens de nossa comunidade estão na faculdade ou já têm curso superior. Aqui o nosso lema é: se não estudar, não dança quadrilha".

Sobre o trabalho feito ao longo de tantos anos de forma voluntária, ele afirma: "Será ótimo se puder ser remunerado pelo que faço, mas esse aqui é um tipo de trabalho que me ajuda a viver. Quando temos cultura e alegria, vivemos mais”.

Maratona para cumprir exigências do edital

Para muitas associações culturais de bairro ou comunitárias, cumprir as exigências para inscrição no edital Pontos de Cultura foi uma verdadeira batalha. O estudante Alex Lima Vasques, diretor de cultura da Associação Baiana de Estudantes Secundaristas – ABES, com sede em Nazaré, revela que a falta de experiência na elaboração de projetos foi a principal dificuldade.

“Somos estudantes e o movimento todo é muito informal, mas procuramos nos informar, consultamos as instruções do site e conseguimos”, comemora Vasques, que quer criar um infocentro e transformar ações esporádicas, como a realização de oficinas e de sessões cineclube, em atividades permanentes.

O professor de teatro, preparador de clown e contador de histórias Rafael Moraes, coordenador do Projeto Apito de Todas as Cores, da Associação Paulo Tonucci, em Camaçari, também achou difícil atender a todos os pré-requisitos, mas afirma que as exigências são necessárias.

“O orçamento devia ser bem detalhado, o que nos obrigou a destrinchar todo o projeto. Deu trabalho, mas agora temos um planejamento e uma visão mais completa das atividades que queremos realizar nos próximos três anos”, explica. Entre elas, está a contratação de mais professores para ministrar as oficinas de clown, griô, perna-de-pau, capoeira, dança, artes, grafite e teatro oferecidas pela associação. Estão em seus planos também a realização de um festival de artes, a compra de equipamentos para a sala de leitura e a transformação de um dos galpões da instituição em centro cultural.