Após constatar, por estudos técnicos, a inviabilidade do projeto de cobertura do Córrego Lava Pés, no município de Itabuna, o Instituto de Gestão das Águas e Clima (Ingá) negou à prefeitura local a autorização para realização da obra. O Lava Pés é afluente do Rio Cachoeira, passa no centro da cidade, na Avenida Ana Amélia, e tem 1.356 metros. O projeto de macrodrenagem da prefeitura pretendia cobrir, com concreto, um trecho de 1.180 metros, além de impermeabilizar o leito.

De acordo com o projeto, a velocidade média de escoamento da água após a canalização é alta, superior ao máximo permitido para canais revestidos em concreto, que é de quatro metros por segundo, o que pode provocar aumento de inundação nas regiões à frente da intervenção, tornando o projeto inviável do ponto de vista hidráulico. O canal estrangula a vazão do rio, aumentando o risco de transbordamentos e inundações no trecho após a obra.

O córrego possui vazão máxima de cheia de cerca de 52,2 mil litros por segundo. Canais de drenagem urbana cobertos e impermeabilizados apresentam uma série de problemas para a cidade e seus habitantes, como alagamentos, enchentes e morte do rio.

“A política de cobrir rios e não tratar esgotos não resolve a situação da qualidade das águas nos centros urbanos. O que precisamos, com urgência, é proteger nossos rios, para que nossos estoques hídricos não sejam prejudicados”, explica o diretor-geral do Ingá, Julio Rocha. “Isso sem falar nos efeitos observados em outras localidades. Em São Paulo, por exemplo, a população vem sofrendo a cada forte chuva com os alagamentos e inundações, em decorrência da existência de mais 40 rios cobertos e impermeabilizados. Neste caso, a água não tem como infiltrar nem para onde escoar, transbordando e provocando danos à cidade”, complementa.

Amparo legal

A negativa da outorga – decisão do órgão gestor das águas na Bahia, está amparada nas políticas e nas leis estadual e federal de recursos hídricos, que determinam que ações e intervenções que possam afetar a quantidade, qualidade e regime das águas superficiais e subterrâneas estão sujeitos à prévia outorga de direito de uso.

A cobertura de rios, córregos e canais também está em desacordo com Instrução Normativa 11/09 do Ingá, que determina que só é permitida intervenção em corpo d’água para melhoria da drenagem desde que não seja adotado revestimento impermeabilizante e que sejam adotados canais em seção aberta e manutenção do leito natural.

Por falta da devida manutenção exigida para seu perfeito funcionamento, estes canais tendem, ao longo do tempo, a acumular em seu interior lixo de variada natureza. Este material, por sua vez, diminui gradativamente a seção útil de escoamento, reduzindo a capacidade de fluxo até um momento em que o escoamento se dará em seção plena. Em consequência disto, poderão ocorrer inundações nestes trechos.

O recobrimento do leito natural e paredes laterais de um curso d’água com material de baixa permeabilidade, como por exemplo o concreto armado, produz uma redução, ou até mesmo ausência do fluxo de base – recarga d’água proveniente do lençol freático – do corpo hídrico.

De acordo com o coordenador de Outorga do Ingá, Gustavo Penedo, não há argumentação técnica que justifique a adoção de uma seção em contorno fechado. A recomendação do órgão é que se faz necessária a elaboração de novo estudo de macrodrenagem para a bacia do Córrego Lava Pés e que contemple principalmente a adoção para este curso d’água de uma seção em contorno aberto e de leito natural.