Afrodescendente abolicionista, músico premiado na Europa, excelente clarinetista, maestro e compositor, o baiano Manoel Tranquilino Bastos (1850-1935), nascido na região do Recôncavo, terá parte da sua memória resgatada por intermédio do livro ‘O Semeador de Orquestras – História de um Maestro Abolicionista’, de autoria do jornalista Jorge Ramos, que será lançado até final do primeiro semestre de 2011.

A iniciativa é da Sociedade Euterpe Lyra Ceciliana, filarmônica da cidade de Cachoeira, fundada por Tranquilino em 1870. A ação integra a política de editais do Instituto do Patrimônio Artístico e Cultural da Bahia (Ipac), autarquia da Secretaria Estadual de Cultura (Secult), que investe com apoio financeiro em projetos de valorização do Patrimônio Cultural na Bahia, sejam eles bens culturais materiais ou imateriais.

A casa do maestro Tranquilino e o seu acervo musical têm tombamento do Estado, por meio do Ipac, desde 1989. O livro vem complementar a salvaguarda estadual, difundindo e divulgando o trabalho do maestro. Utilizando os editais, o instituto estimula a sociedade civil a participar com propostas para a salvaguarda dos bens culturais. Entre 2008 e este ano foram aprovados 24 projetos, totalizando mais de R$ 2,2 milhões investidos.

Os editais são complementados com obras de restauração coordenadas pelo Ipac, que, em Cachoeira e São Félix, já somam mais de R$ 37 milhões. As duas cidades ficam às margens do Rio Paraguaçu e são tombadas como monumentos do Brasil pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) do Ministério da Cultura.

Tranquilino Bastos
Além de músico, compositor, maestro, regente e professor de música, Tranquilino Bastos também atuou como jornalista e deixou vasto acervo de partituras musicais, que foi adquirido pelo Governo do Estado da Bahia e se encontra no Setor de Obras Raras da Biblioteca Central, tendo sido usado como tema de diversas pesquisas e até teses de doutorado.

Sua personalidade o fez ganhar fama internacional, tanto pelas suas escolhas pessoais como abolicionista, espírita, vegetariano e praticante da homeopatia – com a qual praticava caridade – e ainda pela estética de seus trabalhos. Em 1920, com a música Passo Dobrado nº 140 tocada no exterior, a Casa Sax enviou de Paris uma batuta de prata e um diapasão como presente pela consideração à obra.

Sua carreira musical deixou como resultado 295 dobrados, 150 marchas festivas, 50 marchas fúnebres, 205 fragmentos de ópera, 24 composições sacras, 80 composições diversas como valsas, polacas e contradanças, além de nove fantasias e variações, cinco árias para canto e três hinos patrióticos.

Ficou marcada na história de Cachoeira a passeata musical conduzida por ele em 13 de maio de 1888, que reuniu milhares de pessoas, em sua maioria, negros recém-libertos, em comemoração à assinatura da Lei Áurea pela princesa Isabel.

Tranquilino viveu, participou e contribuiu com uma época em que os sons do Recôncavo apareciam muito por meio da oralidade e dos registros da memória, com fusão entre os ritmos afrobrasileiros e a teoria tradicional secular europeia da música, criando uma sonoridade plural e multiétnica.