Se estivesse vivo, este ano, Carybé se tornaria um homem centenário. Celebrando a ocasião, a exposição O Ateliê: Carybé 1911-2011 é uma oportunidade única de se confrontar com o universo criativo do artista. A partir de 1º de abril, o Centro Cultural Solar Ferrão vai abrigar parte do ateliê e 17 pinturas a óleo que Carybé deixou inacabadas e nas quais trabalhava na época de sua morte.

Além das pinturas, fazem parte da exposição peças do mobiliário do ateliê, muitos objetos de arte e livros que o pintor colecionava. “Essa exposição é um prestígio para ele, que colecionou tudo isso com tanto amor”, afirmou Nancy Bernabó, viúva do artista.

O diretor de Museus do Instituto do Patrimônio Artístico e Cultural (Ipac), que assina a curadoria da exposição, Daniel Rangel, destaca a importância da ocasião: “Nesta exposição, poderemos nos aproximar da intimidade do artista e de seu processo criativo. Ao observar o conjunto exposto, damos visibilidade ao entorno de Carybé e podemos até imaginar possíveis caminhos pictóricos ou estéticos que ele poderia seguir para concluir cada um dos quadros”.

O público poderá ver de perto itens que o artista colecionou ao longo da vida, que incluem arte popular das Américas e Ásia, arte africana, arte sacra, entre outros objetos e souvenirs adquiridos em viagens e recebidos (presentes). Também fazem parte da exposição trabalhos de outros artistas, como Mestre Didi e Mário Cravo Jr – de quem foi amigo – e muitas peças de diferentes origens e valores, que tiveram como destino comum a casa do artista e a influência no seu imaginário.

Além da coleção pessoal que Carybé reuniu em seu ateliê, e para a qual funcionou como um curador inspirado e deliciosamente anárquico, compõem o ambiente diversas publicações nas quais o artista trabalhou e outras de que foi tema.

Para se ter uma ideia completa do espaço original de trabalho que o artista mantinha na sua casa em Brotas, quem for à exposição poderá ainda fazer uma visita virtual ao ateliê original, através de um tour 360 graus em computadores instalados em uma das salas.

Mito da baianidade

Realizada pela Secretaria Estadual de Cultura (Secult), via Diretoria de Museus do Ipac, a exposição destaca o processo de produção do artista, ao expor 17 telas em diferentes estágios de desenvolvimento.

No Solar Ferrão, será reproduzido o lugar onde Carybé realizou grande parte de sua obra – incluindo seu cavalete e sua mesa de trabalho, que ainda mantém as paletas de preparo de tintas, pincéis e espátulas, já que o lugar foi conservado da maneira como foi deixado pelo artista, quando da sua morte, em 1997. “Esta foi a razão pela qual o estúdio foi mantido. Queríamos torná-lo público, para um dia as pessoas visitarem, conhecerem”, explicou Solange Bernabó, filha de Carybé.

O secretário de Cultura, Albino Rubim, ressalta a importância do artista: “Como criador, Carybé foi um dos inventores da Bahia. Juntos, ele, Jorge Amado, Dorival Caymmi e outros grandes criadores construíram a Bahia imaginariamente. Uma Bahia boa-terra, singular, colorida e miscigenada. Uma Bahia que pulsa em seu povo. Uma Bahia sintetizada através de suas imagens singularíssimas”.

Foram criadas no ateliê algumas das imagens que até hoje servem como pilares de sustentação do mito da baianidade, construído no Século 20 pela forma como a Bahia foi interpretada por artistas como Pierrer Verger, Dorival Caymmi, Jorge Amado e também pelo próprio Carybé.

Seguindo a tradição da família (Carybé tinha mais dois irmãos que também trabalhavam com arte), Ramiro Bernabó, ceramista e filho do pintor, disse que a exposição tem um caráter ousado. “É interessante ver como era a mesa de trabalho, como ele arrumava as coisas ali. É uma coisa curiosa. Seria bom também ver a mesa de trabalho de outros artistas”.

Daniel Rangel agradece também a generosidade da família de Carybé em dividir este momento com todos: “Uma abordagem possível graças à generosidade da senhora Nancy, Solange e Ramiro, que abriram sua casa e nos apresentaram o que nela existe de mais precioso: o amor deles pelo legado e pela pessoa de Carybé”.