Não eram nem 8h e o bairro mais colorido da capital baiana já indicava qual seria a principal cor do dia. Atraídos pelo toque do atabaque, agogô e do caxerê, milhares de pessoas vestidas de vermelho foram se aglomerando, na manhã desta quinta-feira (4), em frente ao palco montado no Largo do Pelourinho, em Salvador, onde estava a imagem de Santa Bárbara. Era só o início da festa que já existe há mais de três séculos. Como de costume, em decorrência do sincretismo religioso, as canções ora faziam reverência à “santa guerreira”, ora à Iansã ou Oyá – os dois principais nomes para se referir à Santa Bárbara no Candomblé.

Os batuques foram apenas o prenúncio de um dos momentos mais emocionantes das homenagens a Santa Bárbara. No local, durante mais de duas horas, pessoas de todas as idades manifestaram sua devoção na missa campal conduzida pelo padre Lázaro Muniz. “Está bonito. Tudo foi bem montado e pensado, graças a Deus. Está valendo a pena”, disse o sacerdote. De acordo com estimativa do comandante do 18º Batalhão de Polícia Militar, tenente-coronel Valter Menezes, mais de cinco mil pessoas participaram da missa. “Disponibilizamos um efetivo de 138 policiais que, em regime de escala, estão trabalhando aqui hoje durante todo o dia”.

Todos os anos, Adenilza “Morena Bela”, como gosta de ser chamada, sai do município de Valença, a 120 quilômetros da capital, para participar do momento religioso e dos festejos no Centro Histórico de Salvador. Para ela, a Festa de Santa Bárbara “representa muito pra mim que sou de religião de matriz africana. A cada ano que passa, a festa cresce e a fé em Iansã e Santa Bárbara também cresce”.

Procissão

Um dos momentos mais emocionantes foi quando nove homens, diretamente da sacada onde funciona o Centro de Culturas Populares e Identitárias (CCPI), tocaram clarins, os quais tiveram o som mesclado à trilha sonora que embalou abraços e pedidos de paz. Ao final da missa, a procissão seguiu do Largo do Pelourinho até o Quartel do 1º Grupamento do Corpo de Bombeiros (GBM), na Barroquinha. Os devotos acompanharam os sete andores que levaram as imagens dos santos Cosme e Damião, São Jerônimo, São Jorge, São Miguel, São Lázaro, São Sebastião e, por fim, a rainha da festa, Santa Bárbara, que foi conduzida até a parte interna do quartel.

Santa Bárbara é a padroeira do Corpo de Bombeiros. Segundo o comandante do 1º GBM, coronel Antônio Júlio Nascimento, esta foi “a primeira vez, após a reforma, que a população teve acesso ao Quartel do Corpo de Bombeiros”. Nascimento observou que o local, em breve, estará aberto para visitas turísticas. “Já estamos preparando o nosso memorial”. O comandante também anunciou que serão realizadas atividades com os moradores da região. “Em parceria com a igreja [Católica], faremos um seminário para orientar a população sobre a forma de proteger o patrimônio do Centro Histórico. Queremos criar uma brigada de incêndio, em janeiro, com a própria comunidade para que eles [os moradores] também possam atuar em possíveis sinistros”.

Renda extra

Muita gente aproveitou a movimentação no Centro Histórico para incrementar a renda. Colares, lenços, fitinhas, entre outros adereços, todos vermelhos, foram uma atração à parte na festa. Com 37 anos, o pintor, motorista e segurança Edson Silva de Souza aproveita as horas vagas para faturar nas festas populares. Com dezenas de rosas vermelhas nas mãos, ele também participa da Lavagem do Senhor do Bonfim e da Festa de Iemanjá (2 de Fevereiro). “É uma forma da gente curtir, se divertir e fazer um dinheiro extra”, diz. Para minimizar o calor, dezenas de ambulantes com suas caixas de isopor também venderem água, refrigerante e cerveja. Já o acarajé, aos montes, foi distribuído de graça pelas filhas de santo.

Programação

Como já é tradição nas festas de largo em Salvador, a programação se divide entre o sagrado e o profano. Neste sentido, o Governo do Estado, por meio do CCPI, órgão vinculado à Secretaria de Cultura (Secult), preparou uma programação gratuita nas praças e largos do Pelô. A diretora do CCPI, Arany Santana, destacou que a Festa de Santa Bárbara é considerada patrimônio imaterial da Bahia. “Simboliza a luta de um povo. É um grito de fé, de esperança e de resistência. É isso que Santa Bárbara representa. É justo, é claro e óbvio o Governo do Estado apoiar esta iniciativa”.

Foram investidos recursos estaduais da ordem de R$ 90 mil utilizados para a montagem das estruturas de palco, cachê dos artistas, além do Caruru que será servido logo mais as 15h, no Mercado de Santa Bárbara, na Baixa dos Sapateiros. Toda a programação preparada pelo CCPI no Pelourinho é gratuita e pode ser acessada neste link.