“Transformar uma dificuldade em beneficio ambiental”, assim o agricultor familiar José Jorge Xavier de Souza, 40, explica os trabalhos que realiza para o aproveitamento da manipueira (líquido tóxico resultante da prensagem da mandioca). Produtor de farinha há mais de 10 anos, Jorge Goteira, como é mais conhecido, utiliza o resíduo como suplemento mineral para nutrição animal e adubo para a plantação, além de fertilizante na irrigação de áreas.

A tradição do plantio de mandioca, transmitida por gerações, garante o sustento e o desenvolvimento da família Souza, que vive no povoado de São José, na zona rural do município de Esplanada, no nordeste baiano. A produção de farinha vem expandindo cada vez mais no mercado, mas, o que fazer com os resíduos deixados pela mandioca? Era a dúvida de seu Jorge há cerca de dois anos.

Segundo ele, a busca por respostas foi longa, e amigos, vizinhos, a ferramenta internet e, mais recentemente, a Empresa Baiana de Desenvolvimento Agrícola (EBDA), vinculada à Secretaria da Agricultura (Seagri), ajudaram no destino sustentável da manipueira. “Eu estudei muito para executar os experimentos, mas só com a ajuda dos técnicos da EBDA a idéia foi concretizada”.

O agricultor afirma que o convite dos técnicos da empresa lhe deu a oportunidade de participar do XV Congresso Brasileiro de Mandioca, em Salvador, onde conheceu “palestrantes, pesquisadores e extensionistas, que apresentaram a cadeia produtiva da mandioca como um todo. Isso foi primordial”.

Suplemento  

O engenheiro agrônomo da EBDA e coordenador da Cadeia da Mandioca na Bahia, Nereu do Monte, explica que a manipueira é um excelente suplemento mineral para alimentação animal e também vermífugo, podendo substituir o sal mineral comercial e os vermífugos tradicionais.

Na propriedade de Jorge Goteira, a água da manipueira é mantida em um reservatório de fibra, no período de cinco a seis dias, em área sombreada. “Orientamos o agricultor a respeitar o período de descanso para que não haja intoxicação dos animais. Após esse período, é possível oferecer o produto, gradativamente, misturado ao alimento, no cocho, ou de forma direta, para beber em quantidade de cinco a oito litros/animal/dia, na fase inicial de adaptação, e após a segunda semana aumentar a dose para 10 litros”.

De acordo com Nereu, o agricultor tem 14 bovinos de corte, criados em confinamento, que ganham uma arroba (15 quilos) a cada 30 dias, resultado de um manejo adequado. “A forrageira oferecida ganha o complemento da manipueira trazendo-lhes bons resultados”, garante o técnico. Ele alerta ao agricultor que aderir ao uso da manipueira para, antes de qualquer atitude, buscar orientação de um profissional capacitado.

Área de cultivo 

Outra opção adotada na propriedade de Jorge Goteira é o uso da água proveniente da lavagem das raízes de mandioca. “Minha intenção é usar a cultura da mandioca de forma integral”. Após o processo de lavagem, a água é mantida em reservatório e misturada à potável para ser usada na irrigação do capim elefante.

As cascas grossas, resultantes de um processo de repinicagem (acabamento e limpeza da raiz) servem para alimentação animal, depois de passar por processo de descanso e ensilagem, por 21 dias, usando a uréia para o enriquecimento proteico. Para adubação, o agricultor utiliza as cascas mais finas, depois de passar por processo de fermentação. “Este material pode ser usada como adubo nas culturas de laranja, capim e da própria mandioca”, explica o engenheiro.

Projeto Reniva  

O Projeto Reniva, dirigido pela EBDA em parceria com a Embrapa, desenvolve em todo o estado, um trabalho de multiplicação e transferência de materiais propagativos de mandioca, com qualidade genética e fitossanitária.

O objetivo é oferecer aos agricultores familiares manivas-semente de mandioca de qualidade, possibilitando o resgate de variedades tradicionais e a introdução de novas variedades de mandioca mais resistentes e produtivas. Orientar os agricultores sobre as técnicas de plantio e tratos culturais, como espaçamento, limpeza da área e adubação também são atribuições do Projeto.

Na propriedade de Jorge Goteira, os técnicos da EBDA pretendem implantar uma Unidade Didática (UD), onde poderão ser feitos experimentos com variedades de mandioca indicadas para aquela região e o uso de tecnologias sustentáveis no processo de industrialização e aproveitamento da manipueira.

“Jorge Goteira é um agricultor modelo, por isso foi selecionado para ser maniveiro (produtor de semente-maniva), no Projeto Reniva. A estrutura hídrica disponível na sua propriedade para irrigação é uma das qualidades favoráveis à produção de sementes para distribuição junto aos agricultores da região”, enfatiza o engenheiro Nereu do Monte.