“Comunicamos ao senhor a instalação oficialmente do nosso Comando nesta cidade. Sabemos com detalhes da sua militância junto a uma facção das esquerdas em Feira de Santana. O senhor será sequestrado para tomar uma grande surra. Se depois da surra continuar na militância, será eliminado sumariamente. Saudações, comandante do CCC – Secção da Princesa do Sertão Baiano".

Esta é a carta que o Comando de Caça aos Comunistas/CCC – Secção de Feira de Santana enviou ao bancário Osvaldo Ventura de Cerqueira, em 1971, e que foi lida por ele em depoimento ao grupo de trabalho (GT) da Comissão Estadual da Verdade – Bahia em Feira de Santana, na quinta-feira (dia 9). Até agora, já foram ouvidas 29 pessoas.

Na VI Audiência Pública da CEV-BA em Feira, realizada na seccional da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), foram ouvidos ainda o trabalhador rural Alfeu Gonçalves Costa e o engenheiro Jairo Cedraz de Oliveira. A professora Amabília Almeida, que representou a Comissão, ressaltou o empenho do GT "em trazer à tona tudo o que aconteceu no município durante a ditadura militar".

Sindicato destruído

Osvaldo Cerqueira, funcionário do Banco do Nordeste do Brasil (BNB) aposentado, militou no Partido Comunista Brasileiro (PCB) e no Partido Comunista do Brasil (PCdoB) e participou da primeira grande greve nacional dos bancários em 1972.

"Não fui preso, mas sofri os mais diversos constrangimentos. Havia colegas que não se aproximavam de mim na agência do banco, passavam até longe da minha carteira, pois tinham medo de ser presos", disse Cerqueira, que também foi vereador pelo PSDB em Feira. Ele enfatizou ainda a destruição da sede do Sindicato dos Bancários no município, quando mesas e máquinas foram jogadas na rua.

Torturas

O trabalhador rural aposentado Alfeu Gonçalves contou em seu depoimento as perseguições que a família sofreu por causa de um tio, Ovídio Gonçalves da Costa, um soldador industrial, que tinha militância política durante a ditadura.

Segundo ele, o irmão, Manuel José Costa, foi levado para Salvador, onde, para revelar o paradeiro do tio, sofreu muitas torturas que lhe deixaram fortes sequelas, inclusive problemas mentais, tendo sido internado no Hospital Colônia Lopes Rodrigues, em Feira, onde faleceu. Mas até hoje ele não conseguiu o atestado de óbito de Manuel.

O engenheiro Jairo Cedraz de Oliveira, que militou na Política Operária (Polop) e no Partido Operário Comunista (POC), falou da sua atuação no movimento estudantil e exibiu um exemplar do ‘Nova Ação’, de maio de 1977, "um jornal dos estudantes da Bahia", que tem como manchete "Os estudantes, os que trabalham e as liberdades".

Debate

A professora Amabília Almeida e o coordenador do GT em Feira, Sinval Galeão, participaram de um debate promovido pelo Diretório Central de Estudantes (DCE) da Universidade Estadual de Feira de Santana (Uefs) sobre ‘50 Anos da Ditadura Militar’, no último dia 8. Amabília ressaltou a participação dos estudantes e disse que o trabalho da CEV "vai contribuir para que essa memória histórica chegue até a juventude".