Bahia avança em políticas de combate à fome em celebração inédita do Dia Mundial da Alimentação
Foto: Manu Dias/GOVBA

Um dos versos mais conhecidos do poeta Carlos Drummond de Andrade, “Lutar com palavras é a luta mais vã: entanto, lutamos mal rompe a manhã”, foi citado em voz alta ao lado do coordenador executivo da Articulação do Semiárido Brasileiro (ASA), Naidison Baptista, nesta segunda-feira (16), data em que a Organização das Nações Unidas para a Alimentação e Agricultura celebrou, pela primeira vez em uma cidade do Nordeste do Brasil, o Dia Mundial da Alimentação, cujo tema, em 2023, foi “Água é Vida, Água é Alimento”. Baptista foi um dos convidados do evento, realizado no Museu de Arte Moderna (Solar do Unhão) e, nos últimos anos, tem sido reverenciado por sua trajetória de combate à fome na região do semiárido nordestino, onde festejou, recentemente, a marca de 1 milhão e 200 mil cisternas construídas para consumo humano, ou seja, “famílias com água na porta de casa, mulheres que deixaram de carregar latas de água na cabeça”.

Diferentemente do poeta Drummond, no entanto, sua luta não tem sido em vão, já que o programa de construção de cisternas foi, agora, retomado pelo governo federal. Em seu pronunciamento, o governador Jerônimo Rodrigues fez questão de saudar o professor Naidison. “Estamos aqui, hoje, para fazer uma reflexão sobre aquilo que nós já construímos de positivo”, disse o governador.

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“Temos o orgulho de dizer que, na Bahia, graças às políticas públicas de incentivo à agricultura familiar, agroindústria, assistência técnica, cisternas, merenda escolar, a fome foi reduzida nas zonas rurais”, lembrou Jerônimo, ressalvando que a fome não será superada com um toque de mágica: “estamos trazendo os empresários para perto. A gente não pode ver as nossas ceasas e mercados jogarem comida fora. Alguns até dizem que estamos atrasados em encontrar uma solução definitiva para a questão da fome, mas falta de vontade não é. Não assinarei nenhum artigo e não enviarei nenhum documento para a Assembleia Legislativa se eu não tiver a consciência de que eu vou cumprir com aquilo que estou prometendo”.

A noite foi marcada por discursos de esperança e, em alguns momentos, de indignação. O diretor do WFP Centro de Excelência contra a Fome do Programa Mundial de Alimentos no Brasil, Daniel Balaban, fez um pronunciamento destacando a estupidez humana. “Neste Dia Mundial da Alimentação, eu quero falar da estupidez humana. Temos caminhões tentando entrar na Faixa de Gaza para levar alimentos, mas os bombardeios não permitem a entrada. Mais de 700 milhões de pessoas, a maioria mulheres e crianças, passam fome ao redor do planeta e o mundo está preocupado em se matar”, disse ele. “Vocês sabem quanto custa uma bomba, um míssil, um caça? O que se gasta com um míssil daria para levar alimentação escolar para mais de um milhão de pessoas”, frisou.

“Somos incapazes de ajudar o próximo. Temos dinheiro para brincar na lua, para visitar o Titanic. A gente gasta tanto dinheiro com coisa inútil, mas não temos recursos para salvar as pessoas em situação de fome”, salientou, informando que o programa mundial que dirige alimenta diariamente mais de 170 milhões de pessoas, mas os recursos estão cada vez mais escassos: “enquanto o número de pessoas em situação de insegurança alimentar aumenta, os recursos diminuem. Temos de unir esforços. Acredito que estarei vivo para ver o Brasil e o planeta livres da fome. Parabéns ao governador por ter lançado o Programa Bahia Sem Fome”.

O representante da FAO, Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura no Brasil, Rafael Zavala, reverenciou a força da população baiana e de sua agricultura familiar. “É a primeira vez que estamos comemorando o Dia da Alimentação no Nordeste e, principalmente, na Bahia. É hora de utilizar a água com mais sabedoria e produzir alimentos agrícolas essenciais com menos água, restaurando solos degradados. A água não é um bem infinito. Parabenizo as iniciativas do governo estadual, que estão fazendo a diferença na vida das pessoas, pelo compromisso com a água e segurança alimentar. Viva a alimentação saudável, viva a agricultura familiar e viva a Bahia”, enfatizou.

Conferência

A presidente do Conselho do Pacto Contra a Fome, Geyze Diniz, que, durante a tarde de ontem, já havia firmado uma parceria com o governador ao visitar o Centro de Operações e Inteligência, no Centro Administrativo de Salvador, destacou que o desperdício de alimentos no Brasil dos dias de hoje daria para alimentar os 33 milhões de brasileiros que vivem em situação de fome grave. “Queremos chegar em 2030 sem nenhuma pessoa passando fome em nosso país e, em 2040, com toda a população brasileira bem alimentada”, frisou Diniz.

Debora Rodrigues, presidente do Conselho de Segurança Alimentar da Bahia (Consea-BA), disse que não se poderá perder a oportunidade de apontar caminhos na Sexta Conferência Estadual de Segurança Alimentar e Nutricional, que está sendo realizada nesta terça-feira (17). “Temos um caderno com 14 páginas de propostas para estruturar o plano estadual de segurança alimentar e vamos levar essas propostas para o governo federal”, afirmou.

Já o coordenador do Bahia Sem Fome, Tiago Pereira, frisou que o programa, além do compromisso de assegurar, de forma emergencial, a chegada da comida na mesa da população, tem, também, o compromisso de consolidar ações estruturantes, articuladas com políticas públicas, que vão ajudar a erradicar o flagelo da fome no estado. “Não mediremos esforços para tirar 1,8 milhão de irmãos e irmãs dessa situação de fome. Trouxemos de volta para a Bahia o Programa de Aquisição de Alimentos e aprovamos a política de agroecologia e produção orgânica”, destacou Pereira. “No sertão, a gente vivia em casa de taipa e carregava lata d’água na cabeça. Hoje, temos um outro sertão. O sertão possível, onde a educação funciona e a assistência social está cada vez mais ampliada”, sustentou o coordenador, acrescentando que o programa Bahia Sem Fome precisa, agora, ser institucionalizado para que a fome possa efetivamente ser erradicada, sem correr o risco de retrocessos como os ocorridos “entre os obscuros anos de 2016 e 2022”.

O presidente em exercício da Assembleia Legislativa, José Raimundo, destacou a importância do legado do brasileiro Josué de Castro, autor do livro Geografia da Fome, e lembrou que Castro foi presidente da FAO nos anos 50. Disse, também, que o governador contará com os deputados, mesmo os de oposição, em todos os momentos em que prevalecerem as questões de estado que buscam melhorar a qualidade de vida da população baiana. “Temos uma grande responsabilidade e a certeza de que o governador contará com o apoio dos parlamentares e da frente parlamentar de combate à fome. Ou o mundo se modifica ou ele acaba”, assegurou.

Fonte: BSF